Hoje acordei, parecia um dia como outro qualquer, mas tinha alguma coisa diferente no ar, alguma coisa que mexia comigo, me apertando o coração.
Fui andando, andando, e sem querer me vi em frente a uma escada, estava ali como que por um encanto, pois aquele lugar como num passe de mágica me transportou para o passado. Sabe, mãe, eu me vi ao seu lado. Sim, mãe, pois aquele era o lugar preferido seu.
Toda tardezinha, invariavelmente, você se sentava ali e eu corria para seu colo, então me contavas historias, me falava de Deus, príncipes e princesas, reis e rainhas. Quantas vezes ali naquela escada, com um simples passar de mãos me curava um machucado, com uma simples palavra me mostrava o caminho a seguir, com um abraço me tirava o medo do vento e da chuva. Enfim, nesta escada, sem eu perceber, me ensinastes a amar, a viver.
Sabe, mãe, hoje me arrependo de não ter aproveitado mais o tempo ao teu lado, pois a correria da vida, quantas vezes, passei por você e nem parei. E, mãe, eu estava ficando adulto, tinha meus problemas, minhas coisas, coisas de adolescente que você não entende muito bem, não é? Coisas que sozinho posso resolver sem sua opinião.
Mas você não mudou seu jeito, toda tarde estava ali na escada, sentada, esperando que eu fosse também me sentar.
Sabe, mãe, um dia ao passar direto por você, me arrependi, voltei e te beijei, seus olhos no mesmo instante encheram de lágrimas, a seguir um abraço apertado e demorado, depois me disse: “Te cuida meu filho, vá com Deus”.
Hoje cresci, já sou pai, e me vejo no mesmo lugar. Mas sabe, mãe, eu percebi que a escada já não tem a mesma graça, as flores já não são tão belas e nem o perfume é o mesmo, nem os passarinhos que ali faziam ninho cantam mais.
Então me sento e fico a imaginar: o perfume não era das flores, era teu. Os passarinhos faziam ninho ao seu lado e não cantavam uns para os outros, e sim para você.
Ah, mãe, como queria você aqui agora ao meu lado, queria que falasse mais sobre minha infância, queria depois de um dia agitado vir até esta escada, sentar e repousar minha cabeça em seu colo.
Vem, mãe, vem me contar historias de Deus, de príncipes e princesas, de reis de rainhas. Vem, mãe, vem acalmar meus passos, vem enxugar minhas lágrimas, vem tirar as pedras do meu caminho.
Esperem, estou sentindo o mesmo perfume de antes, os pássaros voltaram a cantar, a natureza parece estar em festa. Abro os olhos já lacrimejados e te vejo ali sentada na mesma escada, seus cabelos já estão brancos, sua voz já não é tão forte, já tens muitas marcas do tempo, mas mesmo assim você me abre os braços trêmulos e com os olhos a derramar lagrimas me diz: “Vem.”
Eu corro, te abraço, te beijo, fico esperando um discurso teu, mas afagando minha cabeça, olhando bem firme em meus olhos e com toda sabedoria que Deus da as mães, você me diz a mais linda frase que já ouvi em todo minha vida:
“Meu filho, eu te amo!”
Airton – 10/05/1992