Um dia destes fui acompanhar minha mãe ao médico, e uma moça muito bonita, ao preencher a ficha, foi logo perguntando: “Qual sua profissão minha senhora?” Minha mãe logo respondeu: “Sou do lar”. “Então você não trabalha, só fica em casa?” Antes que uma resposta minha mãe pudesse dar, resolvi educadamente da conversa participar.
“Olha moça, esta senhora, já sem muita força, de passos lentos e cabelos brancos, já batalhou e foi tanto, que de tudo não vou me lembrar. Teve quatro filhos, não tinha hospital, foi com parteira, doía muito, a noite inteira, e ela sem reclamar. Eu era feinho, careca, não tinha dente, mas mamãe toda contente, chamando os amigos, vizinhos, parentes , dizia para toda gente: ‘Vejam que bonito ele é!’. Trocou muitas fraldas, fez mamadeiras, de dia, a noite inteira, era só precisar. Comecei a andar, o medo era tanto, ela me estendia os braços, nem que fosse um só passo, me abraçava, me chamava de campeão, me sentia seguro, tinha coragem para outra vez tentar. Moça, minha mãe me ensinou a andar. Quantas noites mal dormidas ao meu lado ela passava, cantando cantigas de ninar. Não tinha sono, não dormia, até a febre passar, me pegava no colo, aconchegava, parece até que o mundo parava, que era feito só para nós. E um segredo vou contar: as vezes a dor nem era tanta, era só um jeito moça, para no colo da minha mãe mais tempo eu ficar.
Quando fui para a escola, era tudo diferente, difícil, e ela me ensinava tabuada, corrigia palavra errada, e das reuniões com sol ou chuva, de nenhuma faltava. Olhava as notas, queria saber dos amigos, se com algum eu brigava e uma frase deixou comigo: ‘não tem professor ruim, é só você respeitar.’
Na minha adolescência fiquei meio rebelde, com quase nada concordava, achava o mundo errado, tudo fora de lugar, mas minha mãe não perdia a calma e com toda paciência dizia: ‘Isto é uma fase, logo vai passar!’
E na faculdade, era longe, chagava tarde, e um dia entrei em casa sem barulho fazer, e a surpresa foi tanta, minha mãe estava ajoelhada e me abraçando foi logo dizer: ‘Filho, isto faço toda noite; oro para Deus te proteger!’
Sabe moça, minha mãe não tem diploma, destes que eu tenho, de colocar na parede, para todo mundo ver, mas coloque na sua ficha e veja se vai caber:
Minha mãe é:
– Médica, enfermeira, cura dores como ninguém;
– Motorista, costureira, psicóloga, conselheira, contadora de histórias, cantora de cantigas de ninar;
– Fez curso de paciência;
– Aparta brigas como ninguém;
– É professora, sabe tabuada, corrige palavra errada;
– É cozinheira, já fez muita mamadeira e no fogão a gás ou a lenha faz pratos como ninguém;
Coloque também na sua ficha:
– Ela faz castelo de areia, sabe brincar de casinha, chuta bola se preciso for;
– É artista, equilibrista, já se pintou de palhaço e fez mágicas também;
Mas de tudo, e tenho certeza de algumas esqueci, uma, a mais importante, com seu exemplo e oração, me mostrou a cruz, me levou até Jesus e me disse que é Ele a quem devo seguir.”
“Me perdoe eu te interromper, filho, ouvi sua conversa, e uma coisa quero te dizer: não acho que faço tanto, nem percebo, faria todo de novo, pois faço com amor. E na ficha, moça, coloque uma palavra pequena e que gosto de ser chamada, no lugar de profissão, coloque somente:
MÃE!”